verso
PICHAÇÃO
Não era pra ser arte
A pichação que deixei
No teu coração.
A pichação que deixei
No teu coração.
Mas por isso
Você se apaixonou
Porque não era pra ser arte
A rebelião das ondas do mar
E mesmo assim o mar é mar
Sem carecer de opinião
De nenhum senhor.
Você se apaixonou
Porque não era pra ser arte
A rebelião das ondas do mar
E mesmo assim o mar é mar
Sem carecer de opinião
De nenhum senhor.
À
Francy Silva, em sua passagem de aniversário
O
racismo está nu
No
candomblé de Ester
Pedindo
por coberta
Pra
poder ficar.
O
racismo traveste-se na cultura
Na
cultura popular
Sem
ninguém falar nada
Sem
ninguém reclamar.
Tal
como um bicho do mato
Com
teogonia pra se encostar
O
racismo vai ficando
Domesticado,
inato –
Muitos
fingem não notar.
O
racismo está nu
Na
porta do léxico
Nas
sete portas do léxico
E
como aprende a falar
Canta,
esbraveja –
E
muda de nome.
Já
com roupa
Branco
e civilizado
O
racismo desfila
Perfila
um jeito até popular
Com
palavras difíceis no bolso
Diz,
veja só, quem pode entrar.
E
nas sete portas do léxico
O
racismo se encontra com o próprio nome
Num
berço da cor do carvão
E
volta a perder a roupa chique
E
a membrana disfarçada do cão.
E
já nu
Calado,
expropriado
O
racismo já não tem
Pra
quem pedir perdão.
O
racismo está nu
No
candomblé de Ester
Na
porta do Candomblé de Ester
Sem
poder entrar.
Me devolva
E você já chegou
assim
Batendo em minha
porta
Pedindo pra
entrar.
Sapato dentro,
Pedindo café
Me levando pro
quarto
E me fazendo
sorrir.
E você já chegou
assim
Sem fazer de
conta
Brincando de
morder
O ouvido inteiro
Até eu gemer.
E você já chegou
assim
Jogando as
cartas na mesa
Dizendo tudo que
não devia
E gritou, bateu
na mesa.
Rimos juntos no
sofá
Você me
sufocando sem medo
Reclamando de
sua mulher
E eu defendendo
ela
De você e de mim
Pedindo por seu
cuidado
Gritando por seu
cansaço
Fodendo o meu
ocaso.
E você saiu pela
porta
Danado, gritando
Pra voltar de
madrugada
Bêbado,
embriagado
Me batendo, me
empurrando
No sofá.
Bati a cabeça
Sangrei demais
Desmaiei no
tapete
E acordei no
hospital.
Pensei em você
por dias
Mas decidi te
esquecer
Mas você chegou
de novo
Entrou de
mansinho
Sentou na sala
Pisou mansinho
Me disse coisas
dóceis
E eu só me traí
Me joguei no seu
colo.
E esqueci de
tudo
Como da primeira
vez
Me dizendo cada
coisa infinda
Findando cada
parte de mim
Sem pena e sem
dó
E eu sabendo de
tudo
Como consciente
Da minha miséria
moral.
Você me tomou de
mim
Quando irá
devolver?
José Maciel Lopis
Foi ele quem levou
Minha capacidade de amar.
Foi ele quem a levou
Pra não mais voltar
Pisou passos de inocência
Enredou por uma ladeira
E se foi sem me olhar.
Foi como um fantasma
O vento se ria
A fina despoesia
De desfeita
Pôs-se a chorar.
José Maciel Lopes
Foi-se sem mais
Sua alcunha é natural
Assinada com sangue vermelho
De um homem banal
De uma figura leal
Às suas próprias convicções.
Obrigado, José
Por me acordar!
Esse exu
Um exu parado na porta da escola
Parado um ar
E todo preto é de terreiro
E todo terreiro é de preto
É o que há!
Parado um ar
E todo preto é de terreiro
E todo terreiro é de preto
É o que há!
Na desilusão fulgura
Há um ar de preto velho
A poesia é de branco
E o decadente sem mente
Perdura
O poeta se perde
Na dura
Despoesia da Academia.
Há um ar de preto velho
A poesia é de branco
E o decadente sem mente
Perdura
O poeta se perde
Na dura
Despoesia da Academia.
Há um exu no seu olhar
Como que de tosco, sem se ver
O poeta mira o poema
E começa a anotar
Letra após letra
E a poesia vai falando pra ela
Sem mais merecer o poeta
Ele grita, puxa a poesia pelo braço
Ela não é mais dele
O poeta é todo dela
E ela não é mais dele.
Como que de tosco, sem se ver
O poeta mira o poema
E começa a anotar
Letra após letra
E a poesia vai falando pra ela
Sem mais merecer o poeta
Ele grita, puxa a poesia pelo braço
Ela não é mais dele
O poeta é todo dela
E ela não é mais dele.
O poema se transforma num erê
E sai de menino danado
Nas sete portas do léxico
Fantasiado de fantasia
Apaixonado em euforia
O poeta alcoolizado
Vai se perdendo no destrato
De homem-bomba da língua.
E sai de menino danado
Nas sete portas do léxico
Fantasiado de fantasia
Apaixonado em euforia
O poeta alcoolizado
Vai se perdendo no destrato
De homem-bomba da língua.
A poesia é a contra-língua
O contra-discurso ocaso
E o poema sabe disso
Contra-si sincrético
Vai ajeitando o eclético
E virando música.
O contra-discurso ocaso
E o poema sabe disso
Contra-si sincrético
Vai ajeitando o eclético
E virando música.
E o poeta se mata
Sem mais saber
O quão fálico
É o seu atraso.
Sem mais saber
O quão fálico
É o seu atraso.
E vai poema
E mostra
E faz
A poesia o subjaz
E o poeta
Se sente injustiçado
Maltratado
Sem se dar conta
Que o poema
Se perfaz.
E mostra
E faz
A poesia o subjaz
E o poeta
Se sente injustiçado
Maltratado
Sem se dar conta
Que o poema
Se perfaz.
Há um exu na porta da escola
E esse exu é um poema.
E esse exu é um poema.
ESTA MULHER
com a liberdade da mulher
porque ela fala alto,
fuma, bebe, escafede.
Se o homem tem problema
fraqueza renhida
não assume, não cede.
Se o homem tem problema
A liberdade é operária
A mulher que trabalha
Ou vive do vão.
A loucura é o vão do mundo
E a mulher a detalha
Com sua posição da genitália
Sem meia palavra, sem concessão.
Se o homem tem problema
Com seu medo de fracasso
Vou vencendo o seu cansaço
Pra melhor ganhar o pão.
E o homem que mais ganha
Não incomoda com o grilhão
O fracasso é miserável
E sua saga é feita em vão.
Se o homem se incomoda
Com o sucesso de uma mulher
É fracasso e nada mais
A inveja feita em pé
Jesus mesmo era homem
Mas de verdade mesmo era Maria a Madalena
Nela que é bom ter fé.
Dos amores ocultos
mais do que guardo saudade
a última gota de orgasmo
na última for do Lácio
no fundo o infindo
era foda, e deu
o fortuito.
Dos amores ocultos
alguns não se revelarão
na fábula da vida,
mas que foi bom
isso foi, olha a vodka
sobre a cama, jogada
passa uma novela
suspiros, cuspe, gritos
e uma ópera em dó menor.
"Ninguém se importa",
dizia mãe
É foda, alguém se importa
e os amores ocultos
incultos amores
vão e se vão
vêm e se veem
E quem os saberá
senão a irrecôndita
consciência
alagada de orgasmo desde a sua face obscura?
Nem homem e nem mulher...
Não sou homem por inteiro
E por ocasião do destino
Também sou mulher.
Mulher brava
Sou mulher macho
Macho mulher
Por ocasião do meu corpo.
Nem sou mulher por inteira
Às vezes me pego disfarçada
De algo que ainda não tem nome
Mas que dá vontade de ser.
Gozar exige silêncio
Silêncio!
Eu peço silêncio
A todos que sentem a vontade
de gozar.
Gozar exige silêncio
Silêncio, ó, musas!
Silêncio das ninfas
dos gritos de estrada.
Silêncio!
Os gritos são os únicos que
podem falar.
Gozar exige silêncio
das falas
dos discursos
dos orgulhos
Gozar te exige
se dar à mais pura
te-o-gonia!
Porque só deuses
nascem e gozam
em Silêncio!
Este fingimento
Eu
não finjo amor
Nem
dor
Nem
orgasmo
Eu
simplesmente não finjo.
Mas
se sinto amor
Se
sinto dor
Se
sinto orgasmo
Eu
simplesmente finjo
Ainda
mais amor
Mais
dor
Ainda
mais orgasmo
Eu
simplesmente finjo
Com
todo o fingimento
Da
minha pobre similitude
De
farsa.
Notas
sobre ela
Ela
Avisto
de longe
Pego
o caderno
Como
uma pesquisa
E
vou narrando o seu prazer
A
sua calcinha
O
seu orgasmo.
E
vou fazendo
Amor
com os dedos
Despenteando
O
meu marasmo.
E
ela
Como
quem vive
Sorri
pro vento
Impõe
aos mares
Tal
qual uma Oxum
Vira
em intento
E
muda os ares.
Ela
Sem
mais dizer
A
língua lambe
Quando
seu nome
Tento
dizer -
Ela
Uma
heresia
Tento
sorrir
E
ao ver seu rosto
Me
dá prazer.
Ela
Somente
ela.
Meu corpo
Não tenho nada a mais
Do que o que carrego em mim
Herança pesada
Não há como dejetar
Senão perecer.
Não tenho nada a mais
Meu corpo
Minhas regras.
Tamara atravancada
E quem atravancou
Tamara
Só ela
Nada além dela
O xis da questão.
Tamara
Só ela
Nada além dela
O xis da questão.
Ele se apaixonou por ela
Mas foi a cachaça que chegou antes
E o cemitério dos mortos
O seu endereço.
Mas foi a cachaça que chegou antes
E o cemitério dos mortos
O seu endereço.
O amor no mato
O
amor bateu aqui em casa
Colher,
prato na mão
Um
samba de coco
Sou
um homem sem amor.
O
samba desnaturado
Pé
no barro
O
peito é o maior
Sai
amor, não há jeito.
O
amor é a mais invencível
Das
piores invenções imaginadas
Sai,
amor, não és de nada.
O
amor é o samba no escuro
Bamba
feita, certa paira
O
amor é um desfeito
É
um ódio refeito.
Tambor
rufando
O
bicho fala
O
amor tal qual o ornitorrinco
Sem
espécie, cheiro exala.
O
amor chegou aqui em casa
Mas
entrou pela janela
Contas
no pescoço
O
amor é fumo que não traga!
Vai
sair pelo fundo
Sem
direito à fala.
O
amor é a pior das criações
Saudação
aos orixás
Tradução
sincrética
O
amor nem faz sentido
Ciência
gaia.
Sou
um homem sem amor
A
oralidade é que fala
O
amor é a pior das decepções
Sensações,
o sujeito cálido
Estou
louco de amor
O
silêncio é que fala
Sem
sentido
O
homem no mato
O
amor vai passar
Uma
noite não mata.
O meu amor
O meu amor morreu de ideologia
Meu fôlego na rua da folia
Fez sexo e não voltou.
Meu fôlego na rua da folia
Fez sexo e não voltou.
Aonde vai meu amor
A metafísica purista
Quem diria
Brotou.
A metafísica purista
Quem diria
Brotou.
Nihil est
Nunca me roubaram nada
senão a literatura
por isso me tornei uma pessoa ruim.
Nunca me torturaram com aparelhos
senão essa ordem dominante capitalista
que mata de fome ao invés.
Nunca houve quem me roubou uma flor
por isso me tornei uma farsa das piores
dessas que engessam o espírito da paz dominante.
Por isso me tornei o insólito
a despoesia nossa de cada semente ruim
o descaso máximo que a desigualdade despeja
no rito seco e miserável do infinito consumista.
Nunca acordei pelado
sem que estivesse sujo
desse esperma que te ofereço na boca,
ó morte.
Mas nunca mesmo
escrevi poemas que falassem de cu
com medo de que o eu lírico gemesse
em cada noite sem fim.
A história acabou
A história a história
A história acabou
Acabou a história
Mas e o homem, acabou?
Acabou a escória?
A história restou
E restou bem história
E a luta de classes
Ficou bem ficou
Pra provar que
Com homem, a história
Com o nome, a história
Não acaba, só muda
E é preciso correr
De escola em escola
E ser professor
Pra mudar a história
Pra uma vida sem escória
A história a história
A história acabou
Acabou a história
Mas e o homem, acabou?
Acabou a escória?
A história restou
E restou bem história
E a luta de classes
Ficou bem ficou
Pra provar que
Com homem, a história
Com o nome, a história
Não acaba, só muda
E é preciso correr
De escola em escola
E ser professor
Pra mudar a história
Pra uma vida sem escória
Sem cerimônia
Sem cerimônia
quero lhe convidar
pro meu enterro.
Você que me amou
ou fingiu me amar
vai assistir ao fim
com a cara de quem
assiste na Globo a novela
sem saber da traição.
Sem cerimônia
vim lhe anunciar
a minha derrota
pra insistente desonestidade
em que se há em viver.
Sem cerimônia
mando pra porra
o porvir
mando pra zona
o devir
e toda bosta da filosofia ocidental.
Sem cerimônia
chegando a hora de sair
[porque partir é com cerimônia]
nem peço um beijo
porque entendi que muita desgraça
faz quem para sofrer.
Sem cerimônia
eu te perdi
porque já há horas
eu desisti de brigar
por nada, do nada
em nada que você é.
Sem cerimônia
há mais miséria que loucura
mas não te esqueça
de carregar as duas para o cemitério
na hora de me despojar
Sem cerimônia
quero lhe convidar
pro meu enterro.
Você que me amou
ou fingiu me amar
vai assistir ao fim
com a cara de quem
assiste na Globo a novela
sem saber da traição.
Sem cerimônia
vim lhe anunciar
a minha derrota
pra insistente desonestidade
em que se há em viver.
Sem cerimônia
mando pra porra
o porvir
mando pra zona
o devir
e toda bosta da filosofia ocidental.
Sem cerimônia
chegando a hora de sair
[porque partir é com cerimônia]
nem peço um beijo
porque entendi que muita desgraça
faz quem para sofrer.
Sem cerimônia
eu te perdi
porque já há horas
eu desisti de brigar
por nada, do nada
em nada que você é.
Sem cerimônia
há mais miséria que loucura
mas não te esqueça
de carregar as duas para o cemitério
na hora de me despojar
À Clarissa Damasceno
Em tempo de democracia burguesa
liberdade nem se passa
por esse cheiro confuso
de um sempre há que buscar
sempre lutar pra rasgar
a mesma constituição cidadã
que deu direitos sociais
mas manteve mazelas plurais
com um mesmo dogma econômico,
liberal monocrônico
sistema biônico
sem teto e sem chão
com iates e sem pão
burguês com causa
sem vergonha e sem cara.
Em tempo de democracia
Nem há!
Em tempo de democracia burguesa
liberdade nem se passa
por esse cheiro confuso
de um sempre há que buscar
sempre lutar pra rasgar
a mesma constituição cidadã
que deu direitos sociais
mas manteve mazelas plurais
com um mesmo dogma econômico,
liberal monocrônico
sistema biônico
sem teto e sem chão
com iates e sem pão
burguês com causa
sem vergonha e sem cara.
Em tempo de democracia
Nem há!
Télos
E pra terminar
peço socorro
porque não aguento
mais ser feliz.
E se no fim
houver lugar
parte de toda
lógica que brota em mim
se tornará líquido
gasoso.
Pra ocupar
esse espaço de
infinito
peço desculpas
porque jamais
pequei
antes de saber o
que é pecado.
Pra finalizar
como ser feliz
descobri que o
capitalismo só produz
coisas de vidro
gentes de vidro
cercas de vidro
mas onde ninguém consegue enxergar.
E se no fim
houver lugar
eu vou saber
decifrar
cada raiva e dor
que há em mim.
E pra terminar
eu vou cansado
de tanta paz, de
tanto lastro
de tanta coisa, de
tanta máscara
pra nunca mais
voltar.
Pra acabar
Denunciar
Divorciar
Demonizar
Distanciar
Finalizar
O meu legado.
O meu legado.
DIA INTERNACIONAL DA MULHER
Dia internacional da mulher
Dia internacional da mulher
Dia Internacional da mulher
Todo dia é dia da mulher.
Todo dia é dia da mulher
Dia internacional da mulher
Dia internacional da mulher
Dia Internacional da mulher.
Dia internacional do horror
Dia internacional do clamor
Dia internacional do amor
Do seio, da vagina, do suor.
Dia internacional da mulher
De quem se sente mulher
De quem se sente o que é
E o que quer ser o que é.
Dia internacional da mulher
Da mulher da mulher da mulher
Da mulher que gosta de mulher
De homem e do que se é
Da vagina, do seio, da boca
Da louca, do gemido que se quer.
Dia da vagabunda, da puta, da bunda
Da mulher moral, burguesa, da santa
Do quanto é bom ser mulher
Sendo santa, puta, louca ou infanta,
Sendo no instinto mulher.
Dia internacional da maré
O homem complementa
Quem completa é a mulher.
Dia internacional da mulher
Da flor, da dor, da Bahia
Pois a Bahia é mulher
O Amazonas é mulher
Santa Catarina é mulher
E quem não é?
Dia internacional da malícia
Da delícia de ser o que é
Da loucura de amar o que der
Da mulher, da mordida no pé.
Da cor, do bico do peito
Do amor, do clitóris perfeito
Da bunda, cérebro e fé.
Mulher por mulher por mulher
Cada qual com seu próprio jeito
Mas como se compara a mulher
Esse jeito, esse lábio, esse som
Mulher, do amor, do clitóris perfeito
Da bunda, cérebro e fé.
Yansã é mulher
Maria é mulher
Dalila é mulher
Cleópatara é mulher
Virgínia Woolf, Judith Butler ou Simone de Beauvouir
É mulher, é mulher, é mulher.
Dia internacional da maré
O homem complementa
Quem completa é a mulher.
A MONOLOUCURA
Na monocultura
da monobestagem
do cacauicultor.
Oh, santa cultura
Oh, santa putura
da monoloucura
de servo e senhor.
O senhor cacaueiro
é um ser feudal
e quer só dinheiro
escravo e obreiro.
Oh, santa cultura
Oh, santa penúria
do pobre pensar.
Pensar em viver
do pouco do muito
do muito que há.
Na monocultura
da monobestagem
do cacauicultor.
VINGANÇA
DE JANAÍNA
Ele morreu na praia
Mulher quer ser
mulher
E por quê?
Os porquês dos
porquês.
Ele morreu na praia
Porque não a amava
E nem foi Yemanjá
Mulher vingativa
tedesca –
Ele não sabia
nadar.
Ele não a amava
E não foi por não
saber amar
Talvez se o mar
respondesse
O que é se afogar.
Ele morreu na praia
Bem devagar
Ele não lutou lá
nas greves
Nem se filiou a
bloco capitalista
Não tinha rosto,
nem documento
E, indigente,
morreu no mar
E, indigente, nem
foi uma conquista.
– Morte é mesmo
morte
Em enterro de
comunista.
Ele não a amava
Mas foi bem devagar
Vagueando a
reticência que há
No plural da mais
brava existência.
Ele morreu na praia
Sem amor e sem ódio
Sem raiva e sem
mágoa
Sem sexo e sem
identidade.
E não foi culpa do
tempo
E não foi culpa do
evento
E não foi culpa do
mar.
Mas mesmo assim
morreu no mar
Mas ela nem soube
do óbito
Por causa do
silêncio de Janaína
Mas ela nem soube
do crime
Do infeliz que ele
lhe fez passar
Mas ele nem soube
que era crime.
POEMINHA SOCIALISTA
Será que
acostumarei
A não mais dizer
Mercado,
Desigualdade ou
Capital?
Não sei,
Capitalismo,
mas quero sofrer
desse mal!
HONESTINO
Foi num dia desses
que os militares
levaram Honestino de nós
para calar-lhe a voz.
Mas na lista de frequência
não se cansa de repetir ao algoz:
– Honestino Guimarães
– Presente!
A Isaias Carvalho
Defina-me
E eu te direi quem tú és.
És a santa mania de representar o mundo
imagem acústica e conceito
deste fenômeno tão confuso que é a linguagem
Defina-me,caso o signo consiga alcançar
a coisa representada
e caso não consiga
te mostrarei que a arbitrariedade
só me consegue inventar enquanto sou
anjo mau
anjo teu
teu chacal.
Defina-me
e direi que és
a velha mania de inventar o mundo
através da linguagem.
A COISA SIGNIFICADA
Por ocasião do aniversário da amiga Gleide Eliotério
Diga-me teu mistério
essa ânsia profunda do saber
diga-me o que vês do mundo
essa mania exacerbada de viver.
Diga-me palavras teleológicas
que é pra eu acreditar no mundo
diga-me os bons e venham-me os maus
que é pra realidade se confundir com o real.
Diga-me quem tu és
que te direi a natureza pura do mistério
de dizer a coisa significada
de mesclar a coisa representada.
Diga-me quem tu és
que te direi que és
essa velha mania de dizer
que nos transforma em
seres alofônicos e alomórficos
essa velha mania de dizer
translínea e multiforme
que nos pega
do início ao fim
só parar dizer: EU TE AMO!
E disse o poeta:
Haja Luz
E houve o poema
Na incerteza do discurso.
O POETA SE ZANGA COM O POEMA
O poema me acordou
às quatro da manhã
pedindo para o escrever.
Eu me zanguei
e resolvi escrever este.
in memoriam de Juracy Ribeiro
Eu estou vivo?
Pensei.
Não sei.
Sei
que estou aqui pensando
se eu estou vivo...
TC P VC, BLZ?
Meu nome
Está de cabeça pra baixo
Na pós-modernidade.
Meu nome sem acento.
Se Deus existir
Quero que seja cientista
Das ciências naturais...
E que não creia e nem se importe
Com nada mais além do físico.
O Português fala português
O Norte-americano fala inglês
Quem fala o brasileiro?
A Gramática brigou com a Bíblia.
Acabou uma amizade de milênios...
E como ficará a eternidade linguística?
O cientista foi na casa do pastor
E notou que não havia bíblias no banheiro...
Mas havia televisão de LED
E computador pras crianças!
A palavra falou por si própria
Sem a ajuda de nenhum homem
À meia-noite!
E decidiu criar um sindicato...
Viva a consciência de classe!
Minha vó Zefa,
preta cor da escuridão,
está indo pra igreja protestante
louvar a Deus branco.
Ela sempre odiou
Terreiro de macumba...
Rita
À Rita de Cássia Freire, pela visão política, não-clítica e sempre além
Rita
não é um nome,
é um ícone
que mistura o emoticon
ao signo pós-pictogramático,
passando pela arbitrariedade saussureana
e saindo pelo túnel da pós-modernidade.
Nacionalidade
Branco
Preto
Índio
Vários
Muitos
Todos
Outros.
Declarante:
Pardo
Autoafirmação:
Preto.
Sem senso histórico:
Branco.
Conclusão:
Brasileiro.
A PSICOCULPOLOGIA
O homem está doente
E usa duas muletas.
Uma é o Amor
E a outra é Deus...
Psicoculpologia humana...
Um gera a dor
E o outro culpa os seus.
Como ficará a história do Ocidente?
Responda você, homem doente!
E disse Deus: “Haja Luz!”
E houve luz!
Mas parece que naquela época
Já se pensava em racionalização
Pois esse tal de Deus pensou em inventar a noite,
Pois deve ter sido nessa contradição que nasceu a Ciência Humana!
Dúvida da criação
Deus criou o homem
ou o homem criou Deus?
O homem criou Deus
E a linguagem criou o homem.
E quem foi que criou a linguagem?
Mal de fábrica
A indústria me vendeu
Uma camisa de marca
Pra me civilizar.
E eu perguntei:
“Seu industrial,
Quantos ‘macacos’ africanos
O senhor teve que matar?”
CHAMAR DA MORTE
A morte nos puxa
E por mais que fujamos
A morte está lá
Sentada no asfalto
Olhando pra dentro.
A morte nos ama
E por que não a amemos
A morte está lá
Sentada no asfalto
Olhando pra dentro
Chamando pra fora.
A morte nos olha
Com cara de apego
E por mais que fujamos
A morte está lá
Sentada no asfalto
Olhando pra dentro.
A morte nos prepara
Com doenças perigosas
E por mais que tentemos
Fujamos, ou não queiramos
A morte está lá
Sentada no asfalto
Olhando pra dentro
Chamando pra fora.
PRAZO DE VALIDADE
Meu prazo de validade
Me circunda
Me circula
E está querendo me fazer parar.
Meu prazo de validade
Longe de ser só humano
É industrial
É da máquina neocapitalista e neoliberal
Desse sistema obtuso
Que chamam de racional.
Meu prazo de validade
Quem me deu foi o agrotóxico
E as drogas da indústria
E acreditem: não foi a erva oriental
Ou o chá de folhas de pitanga.
Meu prazo de validade
Não devia ser meu!
Mas não me aceitam fora do prazo
Porque sou máquina dessa indústria
De bichos humanos,
De bestas quadradas
De discursos confusos.
Sou filho desse sistema
Dessa moeda, desse fonema
Desse lema de liberdade
Dentro de uma prisão.
Sou filho da metafísica pública
Do orgasmo na hora marcada
Das políticas metaelaboradas
Das mentiras bem criadas
Sou máquina desse padrão industrial lúdico
Sou filho do meu prazo de validade.
PROCURA-SE
Procura-se um terrorista!
Um terrorista altamente perigoso,
Um ocidental desvanecido
Instrumentalizado na mais alta cultura
Da mistura colonizante do Ocidente nordestino.
Procura-se!
Um terrorista!
O mais sujo deles,
O mais inferior de todos os humanos
Mais miscigenado, mais impurificável
Mais profano!
Procura-se.
Procura-se
E é um preto terrorista,
Indígena bicho, bobo, povo mulambeiro.
O terrorista que explica a história americana
Na Ponte eurocentrista do homem
Euro-ocidental.
Na ponte preconceituosa
Mais absurda esquerda pontiaguda
Ponte de vidro que faz sangrar
Como as chibatas de nhonhô João
E o falo do branco, filho do patrão
Que ataca a neguinha safada no chão
Na casa mais moral, cristã, limpa,
Ocidental.
História cega!
Minha alma ofega
Nesse dilúvio
De incompreensão.
Procura-se um terrorista!
O culpado por toda essa sujeira
Nas famílias mais brancas, mais puras,
Apresento-lhes a mais maviosa conquista.
Quem foi o terrorista,
O Ocidental que disse que Cristo não era branco?
O Ocidental que disse que o homem nasceu na África?
É mentira, ele nasceu na Europa
Na raça Ariana, doidivanas, ufana.
Quem foi o terrorista
Que disse que há muito de paradoxo
Na história da branquitude aristocrática,
Do Homini Occidentalium
Da Igreja mais pura, branca e prática
Que vendeu lugar no céu
Com técnicas socráticas?
Procura-se um terrorista!
Um terrorista americano!
E não se pode perdê-lo de vista,
Procura-se um terrorista!
BIG BROTHER
Big Brother
Big regime
Big imprensa ou
Big defesa ao
Big plano ditatorial.
Big Mac
tomando um pouco do lugar de
Big europeus
que não perderam seus
Big espaços na
Big cultura eurocêntrica americana.
Big Orwell
reduzido a
Big laboratórios de quase
Não-Big “realities”
da distopia menos Big.
Big psicologia
Big bunda
Big breasts
Big bosta e
Big dollar na cueca.
Big tempo
da dialética menos
Big hegeliana.
Big indústria
Big Big.
POEMINHA DA NEGAÇÃO
Por que dar um mundo tão grande
de presente pra alguém?
de presente pra alguém?
Ai, meu Deus!
Meu Deus?
Deus não existe,
o que existe é a metafísica das coisas.
Escrita durante e para o I Encontro Latino-Americano de Estudantes de Letras
Estou à procura de alguém
Que esteja ao nível da minha loucura
Do desvario da minha tontura
Da minha doença mais séria.
Estou à procura de alguém
Ao nível da minha cegueira
Condizente com a minha força mais irracional.
Estou à procura de alguém.
Estou à procura de alguém
Que esteja acima da razão mais pura
Na procura mais ébria e obscura
Na chegada mais bruta e obscena.
Estou à procura de alguém
Ao nível da minha ignorância
Da minha criança
Da minha leseira mais eira, mais tonta.
Alguém livre da escravidão mais pronta
Da liberdade mais profunda,
Que seja capaz de resolver seus problemas
Sem axiomas, torturas ou multimorfemas.
Estou à procura, estou à procura
Na minha sobriedade menos pura
Da minha incompreensão mais dura
Que tenho do sistema capitalista.
Estou à procura de mim
Sem medo, barreiras, esteiras, fronteiras
Procura sem fim.
Barreira cruel
Protesto às barreiras que escondem o complexo de favelas da Maré, na Zona Norte do Rio, para que os motoristas não consigam ver.
Ali atrás
está a vergonha
da cegonha mais desumana
da história.
Ali atrás
existe um mundo
metamorfoseado ou inventado –
Sei lá!
Ali atrás
mora o descaso
nas favelas da Maré,
mora o cansaço
sofrido e abatido
jaz a corrupção do vencido
de frente pras costas
do Cristo Redentor.
Ali atrás da Avenida Brasil
não é Brasil
é um cemitério senil
do medievalismo mais abrupto
do sistema consumista.
Ali atrás
existe vida
eu sei que há
moram famílias
comercializam misérias
e o descaso descansa lá.
Ali atrás da Linha Vermelha
existem cores não estudadas
existem fadas recebendo facadas.
Ali atrás
existe um mundo-
existe o mundo
existe o fundo
de um poço seco.
Ali atrás
eu sei que há
balas perdidas
para matar,
mas também há-
eu sei que há
mundos felizes pra procriar.
**
Está ali atrás
Há um mundo lá!
Somos o pó,
Por mais que tentem
Somos o pó.
Somos o pó,
Por mais que tentem,
Por mais que inventem
O que sentem –
Somos o pó.
Somos o pó,
Da mais lúgubre das sensações humanas
Da miséria mais cruel do humano mais egoísta
Somos o pó.
Somos o pó,
O pó deixado na porta,
O mais nojento e humano pó
Impiedoso, hipócrita e irrequieto –
Agora pior,
E o que somos?
Somos o pó.
Somos o pó,
Por mais que tentem
E que planejem
Comprem caminhos
E neles pelejem,
Por mais que sonhem
O mais profundo,
Por mais que criem vários preceitos
E neles escondam seus preconceitos,
Somos o pó.
Somos o pó,
Mas não o pó de Adão
Da Bíblia intocável,
Somos o pó
Do humano fétido,
Da alma invejosa,
Do orgulho ébrio,
Do modismo mais perfeito
“Bondade, amores, sucesso”, bananas...
Somos o pó
O pó da estrada mais suja
Da largada mais inútil
Em busca de algo que não vamos encontrar.
E quando o vinho mais caro
For servido à mesa vasta
Seremos sempre o mesmo pó
À sombra da casa deserta
Em busca de algum lugar.
E quando em nossas vidas pequenas
Querermos brincar de melhor,
A rima não vai rimar
O vento não vai gostar
E violento virá
Mostrar a nós –
Que somos o pó.
A FÚRIA MORAL
Quero estar na boca do povo
Quero ser falado – mal falado,
Tripudiado, rido, quero nada ser querido
Quero estar na boca do povo.
Quero que falem mal, mas falem de mim
Despejando toda a infelicidade
Quero, eu quero sim!
Quero estar na boca do povo
Mas falem algo de mim,
Que avaliem meu péssimo comportamento,
Que me xinguem, que expurguem em mim
Toda a sua, a sua amargura mais amarga.
Quero estar na boca do povo,
Quero brincar com o meu projeto de ciência,
Negando, gargalhando dos tolos que acreditam
Em amores, em bondades – que nojo!
Quero estar dilacerado,
Na boca, na boca alheia
Não quero justiça, não quero verdade
Quero sumir de toda a falsa igualdade
Que defendem nossos legisladores e juristas.
Quero ser alimentado até o fim
Do ódio mais incorruptível,
Da raiva mais profunda
Que tenho do sistema.
Quero ser incompreensível até o fim,
Quero mortes, não quero paz –
Eu quero mais, sempre mais
Toda a ambição de voo de um passarinho.
Eu quero estar na boca do povo,
Sendo ofendido, tangido, ferido
Quero que a boca alheia
Fale, mas fale de mim
E que eu seja o assunto mais sério
Quero que eu seja o assunto mais obsceno
Eu quero ser eu até o fim.
INSURGÊNCIA DO VAZIO
À Rita de Cássia, por ter sido a primeira leitora deste
E disse “Dia!”
E houve dia,
E disse “Noite!”
E noite houve
Prepotente e majestosa,
Quão dócil senhora
Entre as outras.
E disse “Paz”
E houve paz,
E disse: “Dê tudo certo!”
E certo tudo se deu-
A porta mais complicada
Da matemática das horas,
Exata, métrica, venérea
Sutilmente se abriu.
E disse “Luz”
E luz me veio,
E disse “Tempo”
E o tempo parou,
Para as dores dos feridos
Que esperavam a hora
Inédita, audaz e sensível
Do raiar da doce partida sentenciada pela vida.
E disse “Eu vou”
E fui,
Eu disse: “Cor”
E de colorido me pus,
Mas disse: “Amor”
E este não veio,
Nem mesmo uma luz.
E não mais disse
Nem canto,
Ao que a cada momento,
Choro, vivo,
Escrevo tanto e quase tanto,
Conforme se inscreve a dor no meu pensamento.
MINHA LÍNGUA
Quero inventar uma língua pra mim
e que só eu próprio saiba falar.
com adjetivos e conjunções brincando que assim
e construções saindo do lugar.
Quero usar pouco os verbos no passado,
os sofrimentos e dores de amor no imperfeito
aquelas que na vida ‘eu sofria’ no coração,
quero fechar, eu quero é perfectar
quero dar o fim com mais efeito.
Chega de sofrimentos e conjugações sem fim,
na minha língua não há,
chega de dizer que de amor eu ‘chorava’
de amor eu ‘chorei’.
sofrimentos pra lá.
Quero acabar com as condicionais da dúvida
aquelas imperfeitas de nascença.
‘gostaria’ nunca mais,
agora eu vou é gostar.
E as conjunções adversativas,
eu quero é exterminar
que uso de não há,
que uso de não há.
Chega de barreiras entre verbos e complementos,
quero que eles se toquem, se amem
nunca mais objeto indireto, não sincero
com preposições e proposições que me sofrem.
Mas, quero poder sair pra fora a hora que quiser,
sendo essa uma doce excessão
quero que de felicidade me chamem
e conjugar o verbo que me vier,
quero que minha língua tenha ação.
Quero me chamar João Sonho,
quero versos em dó maior,
com cores impressionistas em cada letra de minha língua,
quero Pós-modernismo se puder.
Quero inventar uma língua pra mim
e que só eu próprio saiba falar
com trezentas classes de palavras,
desinências facílimas,
e verbos que me façam sonhar.
CAPITALISMO
Em nome de nossa verdadeira democracia
Querem vender:
A alma,
O sonho,
A aurora.
Querem vender:
A ideologia
A impunidade
A calma.
Querem vender:
Verdades
Vaidades
Bondades,
Saladas.
Querem vender
A democracia improvisada.
NO CAMINHO PRO ENTERRO
No caminho pro enterro:
Parece que tudo parou!
O poeta parou
O louco também parou
O cachorro parou
A vida parou
Ou será que não?
MARCHING TO THE BURIAL
Version translated from “No caminho do enterro”
Marching to the burial:
It seems that everything has stopped!
The poet stopped
The mad man also has stopped
The dog has stopped
The life has stopped
Oh, really? I don’t think so.
MARCHA AO DESTERRO
Dedicado a meu irmão Julival, que tanto tem medo da morte
Numa linha transitória
Caminho pra algum lugar
Ouço crianças chorando,
Celulares tocando
E tão rapidamente eu me passo, eu me vou.
Parece que o tempo não vai parar
Para acalentar quem sofre de amores,
Feridas ou dores,
E caminhando parece até que é devagar.
Mas passa rapidamente,
E voo na tirolesa do tempo
Descendo a ladeira violenta.
Vejo luzes nos túneis,
Tento ver o final do meu eu
Mas não posso,
É tão longe, mas tão perto!
Não, não consigo frear
Essa marcha absurda pra lá.
Estou aqui,
Marchando pra algum lugar
Não, não sei ainda.
Já não tenho medo da marcha
Da marcha ininterrupta
Ninguém para,
Ninguém consegue ficar no mesmo lugar
Tenho vontade de ficar
Mas não há freio
Essa marcha não vai parar.
VIVICIO BEBEDOR
Dedicado ao grande amigo Nadson Vinícius
Vivo bêbado,
Não das bebidas alcoólicas
Mas da vida
Mas da vida.
Vivo louco,
Não jogando pedra ou comendo cocô
Mas do tempo
Dos amores
Das leituras
E da genética de cabeceira.
Sou feliz,
E quem diria–
Não dos amores,
Mas dos amigos,
Por estar vivo
E plantar em algum lugar
A flor da paz
Que pensei não existir
E que só agora pude conhecer,
Mas que há,
Mas que há!
SE...
Se é música ou poesia
Que se faça, que se ria
É sarcasmo, histeria
Quem não fez jamais faria.
Se é dança, se é vida
Que se dance, que se viva
Ninguém jamais viveu a valsa toda,
E se há vivo após morrer
Pra pregar o caminho pros convivas.
Se é sangue, se é luta
Que se sangre, que se lute
Que se morra, que se viva
Mas que se conjugue o ser feliz.
Se é amor, se é ódio
Que se ame, se odeie
Mas que sinta, mas que sinta
Pois sentir já é ser algo.
Se é pra morrer de amores
Que se morra pelas flores
Que são o símbolo da vida
Mas que se morra de amores.
Gabriel Nascimento, em dos momentos mais difíceis de “O Banquete” de Platão
SAUDADE
Estou com saudade
De algo que não sei ainda,
Uma nostalgia tão intensa
Que me invade e me inunda.
Estou com saudade
Porque estou solitário
Quero alguma vaidade
Quero algum espelho.
Quero olhar pro passado
Com menos dor, com menos amor –
Por algo tão velho que se passou
Mas me invade uma flor
Que toca uma bela sinfonia
Que mata, me dói, e que eu amo.
Ai,
Estou com saudade
De algo que eu não sei ainda!
Vou saber, não é só assim
Cara tristeza, seja bem vinda!
Estou com saudade...
Saudade do velho mundo
Do ontem, do agora a pouco que se foi
E ficou eu que já me vou.
LONG WAY
I came too really alone
In this sad and mad way
Lonely I sang the sweet music of mine
That I planned to have done.
Laziness of this tiring and lovely life
They criticize, but they love it
I do love, ‘n realize
Why on earth I really got it.
Someone plays
Someone says
History came
Slow down, it is May.
Someone loves
I enjoy
Time crosses
I go by.
The poem sings
The man pretends
Someone tries the truth
And it is the same.
Gabriel Nascimento, a young Brazilian writer and mad boy
NEGO
O homem disse, seu sinhô
Que ia levar sua nega pro motel
Pro motel
Pro motel.
Nega Candinha assim disse:
– “Oi, meu nego, como vai”?
Eu disse que o tempo, o tempo voa
E eu vou nele de carona
Ou de canoa.
O homem sem coração e explorador disse:
– “Seu nego infeliz, o chicote vai comer no teu lombo”!
Seu nego,
Venha cá explicar
Quantos negos podem existir
Com tantos anos a passar!
Descaminhos
Em homenagem à escuridão da ignorância
Eu,
no silêncio da estrada,
catava caroços pelo chão
Eu,
no caminho de casa
pegava os grãos de areia
contava cada passo com a veia
poética de um grande sonhador
Eu,
no caminho de casa
perdi a estrada
fui parar no chão
errei a passada
toquei a sonata
Me fui,
Sou mim,
Quem lui
Em si?
Eu,
no caminho de casa
começo a cantar em tom menor
algo que começa em mi.
Eu,
estou perdido na estrada
canto como a sabiá que vexada
brinca de ser ninguém ao chão
esperando o caçador que se diz amoroso
que vai matar ela e se tornar Zé Luiz.
Eu,
Sou só eu
Sou só mim
Sol só ré
Sou sol si.
SUNRAY
Version translated into English from the poem “Raio de Sol”
The death is the a new life beginning
The lie is a bad-told truth
Stopping in way it’s the end of the road we can
Danning life is not knowing anything.
Losing oneself is to gain another way
Disappearing is only to be alone
Being defeated is just not having won.
The hard calyx is just one wine more.
The hole is a deeper plain
The present tomorrow is past
The futility is a deep well
For an oldness full of displeasure.
Having luckless is just not having luck
It’s not such it bad the death
Being weak is not being less strong
The swoon is a little trick.
The missing of someone is a provisory tale
The hater is a big annoyance
The virtue is a grand mirror
For who wanna know the road.
The road isn’t such as simple
Many people are trying
Fulgent are they obstacles
Average are their ways.
Clean native wood
Which humanity is tired by hope
Many people are trying
But some of them
Will reach exploit.
Sou só
Dedicado ao pó.
Sou só
E não há quem consiga me tirar dessa solidão!
Sou só,
E não há quem consiga acalmar meu coração.
Vou de pé,
Solitário no bosque da vida
Como a marcha ao suplício de Berlioz
Que não quer mais parar.
Vou só.
Muitos me assistem
Batem palmas
Me riem, e se riem
Muitos me sorriem
Mas só eu continuo.
Tentam dizer que me amam
Mas continuo só.
Meu silêncio
Fala muito no caminho
Ele é um escarninho
De toda solidão que passei.
Sou só,
Não tenho amigos pra me amar como
O vizinho se ama com a esposa.
Sol,
É a minha nota tônica
Só
Estou feito uma sinfônica
Onde o solista não tem acompanhamento de ninguém.
Sou só,
Esta poesia é triste.
Sou só,
Estou de luto e quero chorar.
Sozinho em algum lugar
Enxugo a lágrima ferida e o suor.
Sou,
Eu sou,
Se sim,
Então, vida
Ninguém
Jamais
Não há,
Sou sim,
Sou só.
Não quero que chore
Não quero que chore:
Me disseram que a nave não vai parar
A nave do tempo jamais para
Alguém se machuca
Mas ninguém dá socorro
Porque a nave não para
A nave não para.
I indeed do not want you cry these tears:
Version translated for English from the poem “Não quero que chore”
I indeed do not want you cry hurt tears:
They told me the spaceship won’t stop for us
The spaceship called time never stops
Someone is hurt
But no one helps it
‘Cause the spaceship never stops
The spaceship- say them - it never stops.
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